Escoteiro ou Escuteiro?
Os adeptos do método educativo, concebido por Baden-Powell, conhecido por Scouting, têm sido designados em Portugal por scouts, escoteiros, adueiros, escutas e escuteiros (por ordem cronológica do seu aparecimento).
No início, servimo-nos de scout, termo que em muitos países ainda hoje é usado.
Em Portugal, os responsáveis do nosso movimento, não se contentaram com a simples adopção do vocábulo , como prova, em 1911, o testemunho do comandante Álvaro de Melo Machado, pioneiro do escotismo em Portugal e seu dirigente desde o início. Procuraram a palavra ajustada. Não uma qualquer, mas um vocábulo antigo: escoteiro. E a Língua Portuguesa ofereceu a palavra ideal, quase exactamente ajustada ao termo Inglês. Que quer dizer escoteiro? Nos dicionários: "o que não leva mochila ou alforge; que viaja ligeiro; pagando escote (o que compete a cada um) pelo caminho; explorador". 0 vocábulo teve geral aceitação. Em 1913, surge no próprio nome da primeira Associação dos Escoteiros de Portugal que se formou. Durante mais de duas décadas, tanto escoteiro como escotismo foram usados em Portugal, nas antigas colónias e no Brasil. No nosso país, homens como o Dr. Sá Oliveira, professor de Latim, e o Dr. João de Barros, também pedagogo, utilizaram esta grafia.
Em 1923, o movimento sofreu uma cisão. Alguns dirigentes, contrariando o ecumenismo de Baden-Powell, criaram nova associação reservada a elementos da confissão católica romana, e optaram pelo termo inglês: Corpo Nacional de Scouts Católicos. Mas o termo scout era, pelo menos, incómodo, face ao portuguesismo de escoteiro. Assim, surgiu uma alternativa , na década de 30, escuta, e um neologismo (escutismo) com origem no termo francês écouter. Em socorro da inovação, veio ainda o Acordo Ortográfico Luso - Brasileiro de 1945, com esta singular solução: em Portugal passava a escrever-se escuteiro e escutismo enquanto no Brasil continuava a usar-se escoteiro e escotismo! Aqui, escotismo ficaria reservado para denominar as teorias de John Duns Scoutus ou de Johannes Scoutus Erigena. Não foi uma escolha feliz. Em primeiro lugar, porque escuta não traduz capazmente o inglês scout. Disso se aperceberam os Espanhóis, os Italianos e os Franceses, que não recorreram a palavras que existem nos seus idiomas correspondentes a scout, antes se decidiram respectivamente por explorador, esploratore e éclaireur para denominarem os membros do movimento escotista dos seus países. Escuta, envolve uma ideia eminentemente de imobilidade: o que está a escuta, o que espia, lugar onde se escuta. Ao passo que o inglês scout comporta um vincado carácter de deambulação: soldado enviado a espiar as forças ou movimentos do inimigo; pessoa enviada a sondar o valor de um desportista; explorador. Isto é, missões francamente activas em oposição a escuta que é eminentemente passiva. Estamos mesmo em crer que Baden-Powell nunca a teria escolhido para denominar as suas actividades, sabido como é, que a ideia do movimento lhe era profundamente cara. Em segundo lugar, porque a palavra escuta nunca se popularizou. O povo português desconhece-a com esta utilização, não obstante ela ter surgido há quase meio século. Até mesmo os membros do próprio Corpo Nacional de Escutas lhe não são fiéis. Talvez não seja ousadia afirmar que o termo escuta há muito teria sido esquecido e enterrado, por impróprio e impopular se não persistisse na denominação da associação ? Corpo Nacional de Escutas. E estamos em boa companhia, como a do distinto filósofo Prof. José Pedro Machado, que se pronunciou favoravelmente quanto a escoteiro e escotismo para nos designar e ao nosso movimento.
[adaptado de um artigo do jornal Sempre Pronto]
Afinal, qual delas está certa? Estão as duas, como adiante veremos, embora talvez mais a primeira.
Em 1913, após experiências feitas em 1911 e 1912 por vários grupos, foi fundada a primeira associação escotista portuguesa, a A.E.P. - Escoteiros de Portugal, segundo os princípios delineados por Lord Baden-Powell, o fundador do movimento escotista. Porque a adopção do estrangeirismo ?boy-scouts? não agradou aos seus mentores, foi adoptada uma palavra já existente na língua portuguesa, com uma fonética e um significado muito semelhantes ao scout saxónico: escoteiro, (s.m.) pioneiro; aquele que viaja sem bagagem, gastando por escote; adj. leve; veloz, explorador. (Dicionário Porto Editora)
Em 1923, a Igreja Católica idealizou criar outra associação escotista, mas com carácter uniconfessional, destinada exclusivamente aos jovens que professavam a religião Católica Romana. Assim nasceu o "Corpo de Scouts Católicos Portugueses", mais tarde "Corpo Nacional de Scouts".
Por desconhecimento da pronúncia inglesa e inspiração no escotismo católico francês, a expressão "scout" era pronunciada à maneira francesa: "secúte". E, embora com outro desfecho, a história repetiu-se - os responsáveis daquele movimento católico tentaram encontrar uma palavra portuguesa que soasse ao ouvido de uma maneira próxima de "secúte" e com um significado ajustável. Escolheram o "escuta", justificando que, para além da semelhança fonética, o "scout" era atento e observador e, por isso, se adequava ao significado da palavra. Apesar de ser um conceito muito redutor veio a vingar, dando origem ao "Corpo Nacional de Escutas".
Durante o regime anterior ao 25 de Abril de 1974, a AEP sobreviveu com grandes dificuldades, sendo considerada indesejável e apenas tolerada. Chegou mesmo a ser publicado um Decreto que extinguia a actividade da AEP nas colónias. Entretanto, o CNE, sob os auspícios da Igreja, atingiu uma notável expansão e, felizmente, conseguiu manter acesa a chama escotista durante a longa noite da ditadura. Enquanto o "escotismo" definhava, o "escutismo" foi-se tornando cada vez mais conhecido dos portugueses.
No entanto, até meados do século, é mais frequente encontrar a grafia "escotismo" em livros e jornais portugueses. No entanto o Dicionário da Academia das Ciências de Lisboa reconhece as duas grafias, tanto mais que os brasileiros sempre escreveram "escoteiro".
Esta diferenciação, nunca foi objecto de grande polémica, até porque os escoteiros consideram-se irmãos entre si e os valores da fraternidade escotista estão muito acima de meros preciosismos etimológicos. Pelo contrário, os escoteiros até consideram vantajosa a existência das duas grafias, pois assim se torna muito mais fácil identificar a que associação pertence o adepto dos ideais de Baden-Powell.
Canhotas. Carlos (Dirigente da AEP Ex Dirigente do CNE)
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